domingo, 22 de março de 2009

Características Biográficas.


“Foram sonhos contudo...
A minha vida se esgota em ilusões!”

A 12 de setembro de 1831, na cidade de São Paulo, nasce Manuel Antônio Álvares de Azevedo, filho legítimo do acadêmico de Direito Inácio Manuel Álvares de Azevedo e D. Maria Luiza Silveira da Motta de Azevedo. Inácio Manuel Álvares de Azevedo tinha sido estudante em Coimbra, que trocara por São Paulo, quando D. Miguel ali fechou a Universidade. Exerceu depois o cargo de Auditor de Guerra na Corte, o de Juiz de Direito de Niterói e o de Chefe de Polícia da Província do Rio de Janeiro. Foi ainda, na quinta legislatura, de 1843 a 1844, Deputado Geral pela mesma Província, e como advogado, muito se distinguiu no fôro.
Foi Álvares de Azevedo o segundo a nascer de um casal que teve nove filhos, quase todos prematuramente desaparecidos. Em 1833, em companhia de seus pais veio para o Rio de Janeiro, onde em 1835, a morte de um irmão em Niterói lhe causou profunda comoção. Conseguiram os médicos salvá-lo da moléstia que por então o assaltou com violência. Mas nunca mais readiquiriu a saúde, que até esse tempo não inspirara cuidados. Por isso, entre os seis e os nove anos, não se tratou com maior desvelo da sua educação intelectual.
No começo de 1840 matricularam-no no Colégio Stoll, onde permaneceu até 1844, e foi um estudante excepcional. Aprendeu com rapidez a Geografia e a História, o Francês e o Inglês, e com facilidade logo começou a escrever e a exprimir-se nestas duas línguas. Era o último em Ginástica, o primeiro em todas as outras aulas. Mas os invulgares progressos de sua inteligência não lhe alteravam a candura da índole de menino ingênuo e sem maldade. Depois de levar de vencida no curso a todos os colegas maiores que eles, ia no recreio, plantar flores em pequeninos canteiros, com que dissimulava os seus jardins de criança. Por isso depunha o mesmo Dr. Stoll: “Ele reúne, o que é muito raro, a maior inocência de costumes á mais vasta capacidade intelectual que já encontrei na América em um menino da sua idade.”

“Flores cheias de aroma e de alegria,
Porque na primavera abrir cheirosas
E orvalhar-vos abrindo?
As torrentes da morte vêm sombrias,
Hão de amanhã nas águas tenebrosas
Vos rebentar bramindo.”

Aos 13 anos, em 1844, o abandono do colégio pelo Dr. Stoll e a precariedade da saúde levaram Álvares de Azevedo para São Paulo. Foi em busca da sua terra natal em companhia do Dr. José Inácio Silveira da Motta, seu tio materno. Ali estudou com grande aproveitamento e fez os exames de francês, inglês e latim.
No fim de 1844 regressou ao Rio e a 2 de Junho de 1845, sob o nº 430, se matriculou como aluno galgo, no 5º ano do internato do Colégio Pedro II. Teve então como professor de grego Joaquim Caetano Pereira da Silva, uma das mais puras e legítimas glórias da cultura e inteligência nacionais. O Barão de Planitz, que o preparara para a matrícula no internato, foi o seu explicador de alemão. Dele diria mais tarde quando escrevesse o seu ensaio sobre Literatura e Civilização em Portugal: “...um homem, cuja memória nos é muito saudosa, pela perda de um laborioso erudito, de um sábio lingüista – o finado Barão de Planitz.”
A 5 de Dezembro de 1847, aos 16 anos de idade, recebeu solenemente o grau de Bacharel em Letras. Estava apto a matricular-se numa das Faculdades do país. Ao se inscrever em 1848 no primeiro ano da Faculdade Jurídica do Sul, teve como companheiros Bernardo Guimarães, Aureliano Lessa e José de Alencar.
Com as sua livrarias, o seu teatro, a sua imprensa, que em 1850 dispunha de quarenta e sete jornais, muito mais numerosos de 1851 em diante – uma das épocas mais férteis do jornalismo local, era São Paulo um ambiente deveras interessante, onde entravam em conflito as mais opostas e aguerridas correntes políticas.
A famosa Sociedade Epicuréia datava de 1845, e recrutava os seus sócios no seio da mocidade acadêmica. O seu programa era por em realidade as extravagantes fantasias de Byron, e os nomes dos principais personagens do poeta inglês serviam para apelidar os rapazes que compunham tão estranha associação: Mazeppa, Manfred, Lara, Giaur, Marino Faliero, Beppo, Conrado, Sardanapalo, Mazeppa, Cain. Reuniam-se em lugares incertos, pelos arrebaldes da cidade. De uma feita trancaram-se numa casa, fecharam-lhe todas as janelas, e durante quinze dias, em companhia de mulheres perdidas, á luz mortiça de candieiros, praticaram os atos mais delirantes. Algumas cenas reproduzidas na Noite na Taverna, em que “mulheres dormem ébrias e macilentas como defuntos”, e “o sono da embriaguez lhes pesa negro nas pálpebras, onde a beleza sigilou os olhares da volúpia”.

“Corre alta a noite. E no auge vai a orgia;
Do mar na escuridão se abisma a lua
A pratear as águas que alumia.
Perfumes, flores, a vertigem sua
Nos salões a espalhar – reina em folia –
Lasciva a dança, voluptuosa e nua –
Nos floridos tapetes se agitando
- Servos na mesa as taças coroando.”

Além dos estudos jurídicos, a que se entregava seriamente, leu com avidez obras várias de numerosos autores literários, e escreveu incansavelmente, em prosa e verso: uma imitação do quinto ato de Otelo, de Shakespeare; uma tradução da Parisina, de Byron; o poema O Conde Lopo e muitas poesias avulsas.
Na vertigem da escrita não gostava de corrigir:

“Frouxo o verso talvez, pálida a rima
Por estes meus delírios cambeteia,
Porém odeio o pó que deixa a lima
E o tedioso emendar que gela a veia!
Quanto a mim é o fogo quem me anima
De uma estância o calor: quando formei-a,
Se a estátua não saiu como pretendo,
Quebro-a – mas nunca seu metal emendo.”

Em São Paulo fez grandes e sólidas e amizades, entre as quais as de Aureliano Lessa e Bernardo Guimarães, e com estes planejou publicar juntamente um livro de versos – As Três Liras. Aquele, porém, a quem mais íntima e afetuosamente se ligou foi Luís Antônio da Silva Nunes, que anos depois lhe editaria O Conde Lopo. Nas repúblicas, entre os companheiros mais próximos pela semelhança de temperamentos, conversava longamente sobre literatura, á luz trêmula das velas, nas frias noites do inverno paulistano.
Nas férias de 1849, chegou de São Paulo com o pensamento fixo na morte, pois nela falava continuamente aos parentes e amigos. Contudo, não deixava de trabalhar, de estender cada vez mais sua cultura, lendo sempre, juntamente com os autores de Direito, os seus livros de História, de crítica literária, de erudição enfim, e mais os autores de ficção, sobretudo aqueles poetas que eram da sua preferência: Byron, Shakespeare, Shelley, Heine, Vigny, Musset... Sobre todos, Byron, “poeta-rei”, “cujo ardente ceticismo calara no século”, “o artista das grandes glórias, o cultor de todas as aras enlauradas de heroísmo, idólatra panteísta de todas as façanhas”, “vagabundo romeiro do ceticismo”. “Nos tempos modernos”, escreveu ”Goethe e Byron – Goethe, o poeta das tendências idealistas, Byron, o transumpto da leiva sem fé do século XIX.”
De Dezembro de 1851 até o começo de 1852 esteve em Itaboraí, onde, em propriedade de parentes, passou as férias. Alí teve ocasião de declarar que não era do seu desejo voltar em 1852 a São Paulo, pois tinha o pressentimento que morreria. Planejava concluir no Recife o seu curso.
Na iminência de retomar os estudos jurídicos, a 10 de Março de 1852, depois de um passeio a cavalo, de que caiu, foi que se manifestaram os primeiros sintomas da tuberculose pulmonar, que se ignorava. Sobrevieram sofrimentos atrozes, e Álvares de Azevedo teve de submeter-se á operação de um tumor na fossa ilíaca, feita sem clorofórmio pelos Drs. Bompani e Cesar Persiani, médicos italianos. Após quarenta dias experimentou melhoras, chegou a levantar-se da cama. Mas na manhã de 25 de Abril de 1852, num domingo de Ressurreição, sentiu que estava próximo o seu fim. Confessou-se, recebeu a extrema unção. Pediu á sua mãe que se afastasse do quarto.
Tomou na sua a mão do pai, beijou-a, e exclamou:
- Que fatalidade, meu pai!

“Quanta glória pressinto em meu futuro!
Que aurora de porvir e que manhã!
Eu perdera chorando essas coroas
Se eu morresse amanhã!”

E após algumas palavras que se não mais entenderam, expirou ás 5 horas da tarde, na casa da então rua do Infante, nº 1, atual 2 de Dezembro, nº 13. Tinha pouco mais de 20 anos. Dr. César Persiani deu o atestado médico – enterite, com perfuração do intestino. No dia seguinte foi o enterro no cemitério de D. Pedro II, á Praia Vermelha, mais ou menos no local onde hoje está o Instituto Benjamin Constant.
Em 1853 foi publicado o primeiro volume das obras de Álvares de Azevedo, no qual se continha a Lira dos Vinte Anos. Em 1855 estampou-se o segundo volume. Ambos se esgotaram rapidamente. Tiveram em todo o país uma repercussão enorme.

( Ana Marcia-RJ / 1º SEM. 2008))


segunda-feira, 16 de março de 2009

Álvares de Azevedo.